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Victor Belanciano
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Foi há dias, pela manhã, no café. De repente, aquilo saiu-lhe,
espontâneo, em voz audível, provocando a risota geral. “Adoro vacinas!
Por mim, tomava uma todos os dias ao pequeno-almoço, depois do galão
quentinho!” Falava-se, evidentemente, de um dos assuntos que tem povoado
a generalidade das conversas nos últimos dias: as vacinas e o novo coronavírus.
...a vacina é uma excelente notícia, e deve ser celebrada, mas deve ser
circunscrita ao que é: uma ferramenta que faz diminuir o perigo numa
altura de emergência. Não deve ser vista como a varinha miraculosa que
erradicará todos os dilemas que a pandemia convoca e que vão além das
circunstâncias actuais. O foco tem de ser ainda a prevenção, aprender
com os erros, olharmos para as causas multidimensionais que nos
trouxeram até aqui e para o modelo insustentável de habitar o planeta, e
apostando em simultâneo num bom sistema público de saúde e em
comportamentos responsáveis, seja do ponto de vista colectivo como
individual. E, já agora, em vez do actual endeusamento dos cientistas,
como já aconteceu antes com médicos ou enfermeiros, ter a consciência
de que aquilo que permite gerir de forma satisfatória uma pandemia é a
conjugação de saberes. ...É preciso auscultar e perceber o que se receia ou porque é que é tão
difícil estabelecer relações de confiança entre diferentes pessoas,
instituições ou saberes. A estratégia até agora seguida no combate à
pandemia, em Portugal e na maior parte dos países da Europa, nem sempre o
tem conseguido fazer. Até certo ponto, tendo em atenção as inevitáveis
incertezas e contradições encontradas pelo caminho, é compreensível. É
também por isso que tem existido tolerância em relação a quem decide e
está no poder. Mas a par de imposições, ou estados de emergência, tem de
haver informação clara e completa, e acreditar na capacidade das
populações para a receberem na sua complexidade e a debaterem. É assim
que as relações de confiança se constroem.
Posto isto, venha de lá essa vacina e um abatanado curto, se faz favor!